Eleições na Venezuela: por um partido dos trabalhadores

Por que os revolucionários devem votar nulo? Por que a candidatura Lula em 1989 era diferente da candidatura chavista? Qual é a tática de um partido marxista nas eleições? Qual é o significado do voto nulo da esquerda pequeno-burguesa e da falência da frente de esquerda?

A única garantia da luta do proletariado avançar é a sua organização independente de todos os setores da burguesia. Devido à inexistência de um candidato operário, os revolucionários proletários devem chamar a votar nulo.

Apesar de Nicolás Maduro ter origem no movimento sindical, e de ter sido um integrante da burocracia, ele não é um candidato operário, que representa a luta operária, mas um candidato de um partido abertamente burguês, o PSUV (Partido Socialista Unificado da Venezuela).

A chave da questão é entender que partido estamos enfrentando. Chamar ao voto no PSUV gera enorme confusão, apesar do apoio da população ao chavismo ser massivo. Está colocado o problema da contraposição entre a independência de classe e o apoio condicional e crítico a determinadas reformas chavistas. Entre uma e outras, não pode haver dúvida da importância essencial da primeira que não pode ser sacrificada às segundas.

Votar nas eleições burguesas não é uma verdadeira luta para o proletariado, mas apenas uma plataforma de propaganda. O golpe que a direita pró-imperialista e o imperialismo estão tentando viabilizar não será contido votando em Maduro, mas pela reação popular.

A luta central é contra a direita que aposta no fracasso do chavismo para retomar o poder, com consequências nefastas para os trabalhadores. Ela está indo às eleições com esse objetivo, pois sabe que não poderá vencer. É preciso derrotá-la, mas sem sacrificar a independência  da classe operária diante do chavismo, que corresponde a uma outra classes social, a burguesia nacional.

chavismo se mostrou uma força política muito instável. O golpe em 2003 somente foi derrotado devido à ação espontânea das massas, o que revela a própria dinâmica da situação. O chavismo, como uma típica força nacionalista burguesa de esquerda, procura bloquear essa luta espontânea, impede a organização independente, o armamento da população e luta contra o imperialismo de uma maneira muito limitada. Por isso, apoiar o chavismo em bloco, como o fez o PSOL por exemplo, bloqueia a luta das massas e a reação contra a direita golpista, e deixa o proletariado a reboque da burguesia nacional.

Para derrotar a direita é preciso o partido operário, ou seja, é preciso desenvolver integralmente a força revolucionária da classe operária, sua organização, seu programa socialista. Infelizmente, não há um candidato que represente os interesses do proletariado e portanto não há em quem votar. A situação será resolvida na luta.

 

Por que a candidatura Lula em 1989 era diferente da candidatura chavista?

 

Uma pergunta que surge é em que sentido a candidatura de Lula em 1989, na qual o PCO chamou a votar, era diferente da candidatura chavista? Lula era um candidato operário, surgido das lutas dos metalúrgicos do ABC e, nesse sentido, fazia a luta pela formação de um partido independente avançar. O movimento do Chávez não é o PT de 1989.

A campanha de 1989 de Lula, foi uma campanha proletária e da pequeno-burguesia de esquerda. Lula teve uma votação enorme em todas as fábricas. Os trabalhadores que levavam adiante uma luta sindical e política contra a burguesia tomaram a candidatura Lula como um instrumento da sua luta, embora o fosse apenas de maneira muito limitada e parcial.

Hugo Chávez foi um candidato nacionalista burguês, de extração militar, profundamente ligado ao estado burguês. Nicolás Maduro, apesar da extração operária, é um representante do chavismo, um movimento nacionalista burguês que não tem na base os sindicatos ou as lutas operárias independentes, mas o movimento nacionalista surgido do exército. Uma avaliação parecida também se aplicaria para os Kirchner, Rafael Correa, Humala, Mujica, Bachelet, Ortega e os demais governos nacionalistas burgueses latino-americanos.

A esquerda pequeno-burguesa não consegue entender nada disso devido às restrições de classe, à impossibilidade de realizar uma análise sob o ponto de vista do proletariado. O critério pequeno-burguês é ideológico e moral, não de classe. Para a esquerda pequeno-burguesa a tarefa não é fazer avançar a independência de classe de uma maneira prática, mas a preservação de uma suposta pureza ideológica em abstrata, uma política passiva e sectária.els,w

 

Qual é a tática de um partido marxista nas eleições?

 

A tática de um partido marxista nas eleições deve seguir o mesmo princípio da luta geral, ou seja, a luta pelo desenvolvimento da consciência de classe e, portanto, de uma organização política de classe, a forma prática da consciência de classe. As eleições não passam de uma questão secundária da luta da classe operária, uma vez que o capitalismo não pode ser eliminado em forma parlamentar e eleitoral e a época das reformas parlamentares ficou há muito no passado. Tratam-se apenas de uma tribuna de propaganda pelo programa revolucionário. Deveria ser sacrificada a independência de classe por uma tribuna de propaganda? Se tivermos força suficiente para eleger um deputado, o próprio processo da eleição já seria uma tribuna importante.

A preocupação fundamental dos revolucionários deve ser a separação da classe operária da burguesia, a delimitação permanente, achar e aplicar a política que permita avançar em direção à independência da classe operária e à revolução. É necessário mostrar os interesses diferentes, a necessidade dela ser uma classe independente. Por esse motivo, nunca devemos chamar a votar em candidatos de partidos burgueses ou em candidatos pequeno-burgueses e burgueses de esquerda, mesmo que se apresentem sob o rótulo de “socialistas.

Sobre a questão nacional e a luta democrática há duas” soluções, a da burguesia e a operária. Há políticos que estão vinculados à luta operaria, apesar da política burguesa. Os únicos candidatos do nacionalismo burguês latino-americano em quem os revolucionários operários poderiam chamar a votar, em geral, são Lula e Evo Morales, pois ambos têm raízes vinculadas às lutas operárias e camponesas. Mesmo assim trata-se de uma questão meramente tática que deve ser analisada, caso a caso, no sentido da evolução da luta revolucionária pela independência da classe operária.

 

Sobre o voto nulo da esquerda pequeno-burguesa

 

O ponto de partida da política da esquerda burguesa e pequeno-burguesa é uma enorme confusão sobre o entendimento do imperialismo e do nacionalismo.

A própria existência do imperialismo e dos países atrasados implica na existência de duas alas da burguesia, a imperialista e a burguesia nacional. A existência das contradições entre ambos setores é provocado por fatores objetivos, materiais. O aprofundamento da crise capitalista leva ao acirramento dessas contradições.

O foco da política do imperialismo é tentar viabilizar golpes de estado na América Latina com o objetivo de repassar parte das perdas que decorreram como resultado das derrotas nas outras regiões do planeta, principalmente no Oriente Médio. Por isso, o eixo deve ser atacar à direita, ou seja, o imperialismo. Os ataques ao chavismo devem ser feitos sobre esse prisma, denunciando a sua capitulação diante do imperialismo e a incapacidade de avançar nas reformas devido ao medo, intrínseco do imperioalismo e da organização independente das massas.

Quando a LIT e o PSTU se posicionam pelo voto nulo (http://www.litci.org/artigos/55-venezuela/3776-en-las-elecciones-del-14-de-abril-los-trabajadores-no-tenemos-una-alternativa-independiente), o fazem, basicamente, reproduzindo as críticas da direita imperialista ao chavismo, apesar de reconhecerem que os responsáveis pelos problemas são os patrões, ou seja, os apoiadores de Capriles. Na matéria, os ataques contra a direita aparecem como secundários, e, provavelmente, foram incluídos, somente para constar, devido à pressão que as massas nas ruas têm exercido e apesar do aumento da polarização da luta entre a esquerda e a direita.

De concreto, as políticas colocadas por esse documento são abstrações sem conteúdo real ou mesmo capitatuladoras, sem falar nada sobre a necessidade da organização independente e pela base dos trabalhadores – típico do morenismo.

O discurso de que Chavez não é socialista e por isso deve ser atacado é simplesmente ridículo. Ochavismo não passa de nacionalismo burguês e sob esse ponto de partida deve ser estruturada a política proletária.

Falar que o frango na Venezuela está caro como motivo para combater Chavez, por exemplo, é constatar uma realidade, mas não convence as massas deslindar-se do chavismo. E mesmo se o fizerem, qual seria a alternativa? Capriles? Trata-se de demagogia eleitoral rasteira, típica de quem não tem participação no movimento político real, no movimento sindical ou social, e fica no vale tudo dos discursos demagógicos.

Criticar o chavismo pelo desabastecimento, como o PSTU, entre outros, o faz, também implica em fazer o jogo da direita. Quem provoca o desabastecimento são os capitalistas, como o próprio documento referido o reconhece. Por que, atacar o governo de Maduro diretamente por isso? O correto seria criticar a falta de ação do governo chavista contra a burguesia (intervenção nas empresas, controle operário). Os culpados são os capitalistas, portanto, ao governo, que goza da confiança da enorme maioria da população, lhe deve ser exigido que intervenha essas empresas, que as estatize. E se não o fizer, deve ser denunciado por isso, por capitular, mas em nenhum momento coloca-lo como o principal culpado.

A desvalorização da moeda foi uma medida monetária defensiva perante a queda do faturamento da PDVSA, que está na base do colchão social de controle das massas. A mesma medida seria tomada pela direita e ainda entregaria a PDVSA para o imperialismo, o que lhe obrigaria a acabar com os programas sociais e a impor um regime a la Pinochet para conter as massas. Isso deve ser deixado muito claro, do que esse documento passa muito longe.

A política de atacar o chavismo em bloco e a de colocar no mesmo nível a burguesia nacionalista e a direita pró-imperialista são profundamente erradas devido a que, além de igualar as duas alas da burguesia, confundem a estratégia (entendimento do caráter burguês do nacionalismo) com a tática, isto é, a política que permitiria ganhar as massas que formam a base social do chavismo.

Os revolucionários proletários não deveriam atacar o chavismo em bloco, mas nos aspectos práticos. Por exemplo, nós concordamos com a defesa do petróleo, dos programas sociais e a crítica contra a direita liderada por Capriles mesmo com todas as deficiências e limitações enormes que apresenta. Mas, ao mesmo tempo, nós sabemos que o chavismo, como típico nacionalismo burguês, é incapaz de levar a luta até o fim; isso somente poderá ser feito pela classe operária por meio de um partido operário.

 

A falência da frente de esquerda

 

O ponto de partida da política revolucionária proletária é lutar pela organização do partido revolucionário de massas do proletariado e não votar em quem tiver o discurso mais bonito. O problema colocado é como ter acesso à classe operária, que na Venezuela é chavista, na Argentina peronista e no Brasil petista. A nossa política deve estar orientada para o movimento operário e não para organizações centristas ditas trotskistas.

A política da frente de esquerda busca aglutinar grupos centristas com o objetivo básico de eleger um deputado, o que implica na necessidade prática de capitular diante da burguesia em vários aspectos, normalmente rebaixando o programa para se mostrar palatável perante a imprensa burguesa ou para adequar-se de grupos oportunista, como os influenciados pelo morenismo. Colocar a luta da classe operária nas mãos da esquerda centrista da Venezuela, que no fundo é chavista, é repetir uma política fracassada.

O candidato “natural” da esquerda pequeno-burguesa e dita trotskista, Orlando Chirino, desistiu de participar como candidato independente, e a deixou órfã. Todos esses grupos se acovardaram perante as gigantescas mobilizações das massas, das quais não tiraram conclusões políticas.

Chirino é um chavista de carteirinha. Ele é um antigo burocrata chavista desde a fundação da CNT (Central Nacional dos Trabalhadores) pelos chavistas em 2003, após o lockout patronal e a tentativa de golpe de estado da direita, com o objetivo de disputar o controle da organização dos sindicatos à ultrapelega CTV (Central do Trabalhadores de Venezuela). Chirino foi empossado como funcionário da PDVSA em 2003 por meio da indicação do presidente da SINU-TRAPETROL, um dos dirigentes sindicais que fora empossado na nova diretoria da PDVSA por meio de um decreto presidencial. Em 2007, Chirino foi demitido por não concordar em integrar-se formalmente ao novo PSUV (Partido Socialista Unificado da Venezuela) e por não ter defendido o voto no “SIM” no referendo que foi derrotado em 2007.

Chirino passou a fazer parte do PPT de Henri Falcón, uma ruptura com Hugo Chávez pela direita que em 2010 acabou se aproximando da MUD de Capriles. Chirino se distanciou de Falcón e fundou o PSL (Partido Socialista e Liberdade), ligado à autodenominada internacional trotskista UIT-QI, que no Brasil é representada pela CST, do deputado do PSOL Babá, e na Argentina pela Esquerda Socialista que faz parte da Frente de Esquerda liderada pelo PO (Partido Obrero), grupos incuravelmente centristas pequeno-burgueses e frentepopulistas. Nas eleições presidenciais de outubro do ano passado, a frente liderada por Chirino obteve apenas 4.000 votos.

Agora, Chirino, para desilusão da esquerda pequeno-burguesa, não quis sair como candidato independente e passou a apoiar a Maduro, o que aliás não é uma ação muito heroica num momento de ascenso do apoio popular; muito mais heroico teria sido haver apoiado Hugo Chávez em 2007 com a direita e o imperialismo promovendo uma enorme campanha contrária. Chirino é chavista e o momento de apoiar Maduro é justamente agora, no sentido mais oportunista da política, considerando a obtenção de ganhos, pois é agora que o chavismo está em ascenso. Da mesma forma, Chirino rompeu com o chavismo quando a pressão da direita e do imperialismo estava em ascenso. Não é uma orientação política, mas um líder e um partido que flutuam ao sabor das ondas.

A medida em que a situação evolui, certas políticas, como a própria frente de esquerda, vão ficando mais claras, mostrando que não contribuem para a construção do partido revolucionário do proletariado. Formar um bloco de esquerda em torno de Chirino é oportunismo puro e o fato dele não ter aceitado sair candidato, não é nada surpreendente e comprova esta tese. Chirino é, na realidade, a Heloísa Helena venezuelana. A frente de esquerda venezuelana é chavista e, por esse motivo, em nada contribui para a luta do proletariado. A luta deve ser por um partido operário que tenha um candidato vinculado à luta operária e sua lutas independentes.

 

O programa revolucionário para a Venezuela

 

O programa concreto para a Venezuela, assim como para a América Latina, deveria justamente propor a construção do partido revolucionário do proletariado ao invés de ficar criticando o chavismo a esmo. É preciso entender que os trabalhadores apoiam o chavismo porque ele atende parte das reivindicações, enquanto a esquerda no melhor dos casos faz um discurso bonito.

O ideal seria lançar um candidato proletário próprio, levando em conta que as eleições burguesas, sob o ponto de vista marxista, não passam de uma tribuna propagandística. É neste sentido que os revolucionários deveriam ter trabalhado para estas eleições ou em vista ao futuro, independentemente de ter poucos votos.

Encarando o processo eleitoral como uma tribuna, é preciso focar-se na divulgação do programa revolucionário ao invés de “eleger um deputado de esquerda” como propõe, por exemplo, a Frente de Esquerda argentina, ou o PSOL e o PSTU no Brasil.

A política da frente de esquerda é uma política centrista, oportunista e focada em questões eleitorais que visa mostrar um tamanho desses grupos numericamente maior. Não tem nada a ver com a política de frente única operária e anti-imperialista da III e da IV Internacional, nem com a experiência revolucionária prática posterior, por exemplo, a da revolução boliviana.

O fato de obtermos poucos votos nem sequer deveria nos impressionar. Conforme formos aparecendo perante a população, principalmente através de uma correta orientação para as suas lutas econômicas e políticas, uma vez que elaborarmos a política correta, poderemos ir aparecendo como uma alternativa conforme a própria situação objetiva for evoluindo e até termos mais votos no futuro. Em momento de refluxo para os revolucionários é sempre preciso participar dos processos eleitorais, mas levantando a bandeira da política revolucionária, nunca priorizando a eleição de um deputado. Somente se justifica não participar do processo eleitoral quando ele contrariar, servir como obstáculo a outro movimento que estiver se desenvolvendo em outro sentido. Neste sentido, chama a atenção que a enorme maioria dos grupos da esquerda dita trotskista, apesar de serem super eleitoralistas não lançam, ou pelo menos tentam lançar, candidatos independentes, que divulguem o próprio programa, em quase lugar nenhum.

Publicado no Causa Operária Online número 3118, de 11 de abril de 2011

http://www.pco.org.br


Uma resposta para “Eleições na Venezuela: por um partido dos trabalhadores

  1. Concordo com o voto nulo, porem, contudo todavia, descordo que o P-sol inteiro seja chavista, e o companheiro Rui Pimenta sabe muito bem disso, no P-sol somente o MES, a LSR e a APS são chavistas, inclusive nas últimas eleições lançamos o companheiro Orlando Chirino como candidato a presidência da Venezuela pelo Psl.

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