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200 anos do nascimento de Richard Wagner: A unificação alemã na música

 

 Richard Wagner, na íntegra Wilhelm Richard Wagner (nascido em 22 de maio de 1813, em Leipzig, Alemanha, morreu em 13 de fevereiro de 1883 em Veneza, Itália). Compositor dramático alemão e teórico, cujas óperas e músicas tiveram uma influência revolucionária no campo da música ocidental, seja pela extensão de suas descobertas ou reação contra elas. Entre suas principais obras estão O Holandês Voador (1843), Tannhäuser (1845), Lohengrin (1850), Tristão e Isolda (1865), Parsifal (1882), e sua grande tetralogia, O Anel dos Nibelungos (1869-1876).

Wagner nasceu em um ambiente musical (várias irmãs mais velhas se tornaram cantoras de ópera ou atrizes) e este fato foi uma influência decisiva em sua vida. Era um estudante displicente no Kreuzschule, Dresden, e na Nicholaischule, Leipzig. Ele frequentava concertos, no entanto, ensinou a si mesmo piano e composição, e lia as peças de Shakespeare, Goethe e Schiller. A literatura também seria decisiva na sua vida e carreira.

Matriculou-se na Universidade de Leipzig, mas como um ajunto com privilégios inferiores, pois não completara seus estudos preparatórios. Embora levasse uma vida boêmia, dedicou-se intensamente à composição. Indisposto com o ensino acadêmico, sua verdadeira formação foi um estudo íntimo das músicas dos mestres, em particular Beethoven, cume da música alemã. Ao sair da universidade, compôs sua primeira ópera em Würzburg, Die Feen (As Fadas), baseado em um conto fantástico de Carlo Gozzi. Ele não conseguiu que a ópera fosse produzida em Leipzig e tornou-se regente de uma trupe teatral provincial de Magdeburg, depois de ter se apaixonado por uma das atrizes da trupe, Wilhelmine (Minna) Planer, com quem se casou em 1836.

Em 1839, foi para Paris, mas seus três anos em Paris foram cercados de problemas. Apesar de uma recomendação do compositor alemão Giacomo Meyerbeer, Wagner não conseguia entrar no círculo fechado da ópera parisiense. Vivia com uma colônia de artistas alemães pobres e evitou a fome por meio do jornalismo musical e trabalhos diversos. No entanto, em 1840 ele completou Rienzi (após a novela do inglês Bulwer-Lytton, autor de Os últimos dias de Pompeia), e em 1841 compôs sua primeira ópera significativa, Der fliegende Holländer (O Holandês Voador), baseado na lenda do navio fantasma.

Em 1842, aos 29 anos, voltou para Dresden, onde Rienzi foi triunfalmente apresentada em 20 de outubro. No ano seguinte, O Holandês Voador (produzido em Dresden, 2 de janeiro de 1843) foi menos bem sucedida, uma vez que o público esperava um trabalho na tradição franco-italiana semelhante ao Rienzi e ficou intrigado com a forma inovadora em que a nova ópera integrou a música com o conteúdo dramático. Mas Wagner foi indicado regente da ópera da corte, cargo que ocupou até 1849. Em 19 de outubro de 1845, Tannhäuser (dando início aos temas nacionais e prenunciando já a Revolução de março de 1848) foi recebida sem calor, mas logo começa um crescimento sistemático da sua influência.

As autoridades da ópera da corte em Dresden se recusam encenar sua próxima ópera, Lohengrin. Wagner propõe a reorganização da ópera. Suas propostas teriam tomado o controle da ópera da corte e criariam um teatro nacional cujas produções seriam escolhidas por um sindicato de dramaturgos e compositores, já um reflexo da radicalização revolucionária. Atraído pelas idéias socialistas, ele então se envolveu na revolução alemã de 1848-1849. Wagner escreveu uma série de artigos defendendo a revolução e tomou parte ativa no levante de Dresden em 1849. Quando a revolta fracassou, foi emitido um mandado de prisão contra ele, que fugiu da Alemanha, impossibilitado de comparecer à primeira apresentação de Lohengrin em Weimar, dada por seu amigo Franz Liszt em 28 de agosto de 1850.

Nos próximos 15 anos, Wagner não apresentaria quaisquer novas obras. Sofre o profundo refluxo causado pela contrarrevolução. Exilado, até 1858 viveu em Zurique, compondo, escrevendo tratados e regendo. Depois de já ter estudado a lenda de Siegfried e os mitos nórdicos como uma possível base para uma ópera e ter escrito uma ópera “poema”, Siegfrieds Tod (A Morte de Siegfried), no qual ele concebeu Siegfried como o novo tipo de homem que iria surgir após a vitória revolucionária , escreveu uma série de volumes de prosa sobre a revolução, social e artística. De 1849 a 1852, produziu suas obras fundamentais de teoria estética: Die Kunst und die Revolution (Arte e Revolução), Das Kunstwerk der Zukunft (A Obra de Arte do Futuro), Eine Mitteilung um meine Freunde (Uma Comunicação para os meus amigos) e Oper und Drama (Ópera e Drama). Nesta última delineou um novo tipo, revolucionário, de palco musical – o vasto trabalho com que, de fato, ele estava comprometido. Até 1852, ele havia acrescentado ao poema de Siegfrieds Tod outras partes, sendo a tetralogia batizada como Der Ring des Nibelungen (O Anel dos Nibelungos) compreendendo: Das Rheingold (O Ouro do Reno) , Die Walküre (A Valquíria); Der Junge Siegfried (Young Siegfried), mais tarde chamado simplesmente de Siegfried, e Siegfrieds Tod (A Morte de Siegfried), mais tarde Götterdämmerung (O Crepúsculo dos Deuses).

O Anel dos Nibelungos é a culminação da obra de Wagner, para a qual ele havia encontrado seu caminho no passado, durante o seu amadurecimento revolucionário e socialista. Desta forma, anunciou o desaparecimento da ópera como entretenimento para uma elite separada e acima do povo e o surgimento de um novo tipo de trabalho de palco musical para o povo, expressando a auto-realização da humanidade livre. Este novo trabalho veio mais tarde a ser chamado de “drama musical”, embora Wagner nunca tenha usado este termo, preferindo “drama”.

O Anel, no entanto, marca não apenas o apogeu, mas traz já os primeiros sinais da decadência futura da obra: sua filosofia social otimista tinha se rendido a um metafísico pessimismo, logicamente um reflexo do impasse revolucionário que é característico da evolução da Alemanha no século XIX, alimentado por sua descoberta da filosofia de Arthur Schopenhauer. O resultado foi Tristão e Isolda (1857-59), de que o agente cristalizador foi o seu amor impossível por Mathilde Wesendonk (a esposa de um patrono rico), o que levou à separação de sua esposa, Minna.

Wagner completou Tristão e Isolda em Veneza e Lucerna, Suíça. O trabalho revelou uma nova sutileza no uso de leitmotiv, que em Das Rhinegold e Die Walküre, em que ele tinha usado principalmente para explicar a ação do drama. O impacto da teoria da supremacia da música entre as artes de Schopenhauer levou-o a inclinar a balança expressiva do drama musical mais para a música, deslocando-se da ideia revolucionária e popular do drama integral.
iwagnew001p1Em 1864Em 1861, uma anistia permitiu-lhe voltar para a Alemanha, a partir daí ele foi para Viena, onde ele ouviu Lohengrin pela primeira vez. Ele permaneceu em Viena por cerca de um ano, em seguida viajou extensamente como um maestro e esperava uma produção projetada de Tristão e Isolda. Quando este trabalho não foi produzido porque os artistas ficaram perplexos com suas inovações estilísticas revolucionárias, Wagner iniciou um segundo trabalho “normal”, a comédia-ópera Die Meistersinger von Nürnberg (Os Meistersingers de Nurenberg), um tema nacionalista menos ambicioso e mais moderado, para o qual ele incorporou em sua nova concepção de drama musical alguns dos antigos elementos de “ópera”. Em 1864, porém, sua despesa em grande escala e os hábitos inveterados de empréstimos e de viver às custas dos outros o levaram ao desastre financeiro: ele teve que fugir de Viena para evitar a prisão por dívida. Ele chegou em Stuttgart sem um tostão; um homem de 51 anos sem um futuro, quase no limite de suas forças., no entanto, Luís II, um jovem de 18 anos, subiu ao trono da Baviera, um grande admirador da arte de Wagner e, depois de ter lido o poema de O Anel dos Nibelungos (publicado no ano anterior, com um pedido de apoio financeiro), convidou Wagner para completar o trabalho em Munique sob o seu mecenato.

O rei o pôs em uma casa, e durante os próximos seis anos, houve produções de sucesso em Munique de todas as obras representativas de Wagner até a data, incluindo as primeiras performances de Tristão e Isolda (1865), Die Meistersinger (1868), Das Rheinegold (1869) e Die Walküre (1870), os dois primeiros dirigidos pelo grande maestro de Wagner, Hans von Bülow. Inicialmente, um novo teatro em Munique foi projetado para esse fim, com uma escola de música ligada, mas não vingou devido à oposição despertada pelo modo de vida de Wagner. Não só ele constantemente se endividava, apesar de seu salário principesco, como também tentou interferir no governo do reino. Além disso, ele se tornou o amante da esposa de von Bülow, Cosima, filha de Liszt. Ela lhe deu três filhos: Isolde, Eva e Siegfried, antes de seu divórcio em 1870 e seu casamento com Wagner, no mesmo ano. Por todas estas razões, Wagner considerou oportuno deixar Munique já em 1865, mas nunca perdeu a amizade do rei, que o colocou em Triebschen no lago de Lucerna.

 

Últimos anos em Bayreuth

 

Em 1869, Wagner tinha retomado o trabalho com O Anel dos Nibelungos, que agora ele trazia para sua conclusão pessimista. Ele havia acordado com o rei que a tetralogia deveria ser realizada pela primeira vez na sua totalidade em Munique, mas Wagner quebrou o acordo, convencido de que um novo tipo de teatro deveria ser construído para o efeito. Tendo descoberto um local adequado na cidade bávara de Bayreuth, ele visitou a Alemanha, regendo concertos para arrecadar fundos e incentivando a formação de sociedades para apoiar o plano e, em 1872, a pedra foi colocada. Em 1874, Wagner se mudou para Bayreuth, que ele chamou de Wahnfried (“Paz da Ilusão”). Todo o enorme projeto foi finalmente realizado, apesar das enormes dificuldades artísticas, administrativas e financeiras. O rei, que tinha fornecido Wahnfried para Wagner, contribuiu com uma quantia substancial. O Anel dos Nibelungos teve a sua primeira performance completa no novo Festspielhaus em Bayreuth em 13, 14, 16 e 17 de agosto de 1876. Foi um grande sucesso.

Wagner passou o resto de sua vida em Wahnfried, fazendo uma visita a Londres em 1877 para dar uma bem sucedida série de concertos e, em seguida, fazendo várias na Itália. Durante esses anos, ele compôs seu último trabalho, o sagrado festival de teatro Parsifal, iniciado em 1877 e produzido em Bayreuth em 1882, ele também ditou à sua esposa sua autobiografia, Mein Leben (Minha Vida), iniciada em 1865. Ele morreu de insuficiência cardíaca, no auge de sua fama, e foi sepultado no terreno da Wahnfried, no túmulo que ele mesmo tinha preparado. Desde então, exceto por interrupções causadas pela Primeira Guerra Mundial e Segunda, o Festspielhaus foi palco de festivais anuais de obras de Wagner.

A inovação musical de Wagner, que veremos em pormenor na nossa próxima edição, tem como ponto de partida o impulso revolucionário de 1848. Sua obra subsequente evolui com a evolucão da luta pela unificação alemã que culminará com a famosa “via prussiana”, ou seja, pela realização dos objetivos revolucionários por métodos contrarrevolucionários, de onde se extrai a sua inclinação shcopenhauriana, metafísica e pessimista que inicia ao final da famosa tetralogia dos Nibelungos. Com Parsifal (1882), sua inflexão conservadora e inclusive para o cristianismo já é marcante. Foi o grande renovador da ópera, em seu crepúsculo, juntamente com Verdi.

 

Publicado no jornal Causa Operária número 746, de 8 de junho de 2013

Causa Operária

 

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